7- TRABALHO ESCOLAR
A festa tinha sido extraordinária. Como na última vez, todos adoraram a festa e fiquei famosa por ser uma ótima anfitriã, embora tenha sido Gabi a organizadora de tudo. Mas toda festa tem sua bagunça, e tivemos de arrumar tudo.
- Isso não é o máximo? – Gabi trovejou, enquanto varria a garagem – Todos juntos outra vez, fazendo faxina, como nos velhos tempos.
- A é! Estou explodindo de tanta empolgação. – Max falou com sarcasmo – Pelo que eu sei, nos velhos tempos a Bia não estava e também não tínhamos a opção de deixar a empregada limpar. E hoje temos!
- Fomos nós que desordenamos, então nós limparemos! – Gabi rebateu.
- Você só reclama, Max. – Luiz o repreendeu.
- E você só a defende.
Estávamos todos terminando de limpar a garagem. Gabi varria, Max tirava os lixos, Luiz organizava, Alex desmontava as coisas e eu varria paralelamente a Gabi.
Max nunca ficava de mau humor, a não ser que você fosse a casa dele às nove horas da manhã, depois de uma festa que varou a madrugada, e o obrigasse a fazer uma faxina. Luiz fazia tudo de bom grato, já que sabia que depois teria todo o tempo que quisesse com Gabi. Alex estava quieto fazendo seu serviço o que me fez ir até ele e perguntar:
- Alguma coisa errada? Você está muito quieto hoje.
Ele largou o globo de luz que acabara de tirar do teto e passou a mão por minha cintura, fazendo-me ficar mais perto de seu corpo.
- É que estava me lembrando do meu último aniversário. Eu estava em um manicômio, proibido até de ligar para você, desabafando com uma falsa amiga e chorando rios de lágrimas.
- Já eu estava na casa do Luiz, com uma aparência horrível, desabafando para alguém que estava pior que eu e chorando rios de lágrimas.
Ele me beijou com urgência. Relembrar esse passado era pior do que relembrar meu encontro suicida com uma psicopata. Fomos interrompidos pelo grito de Max:
- Acabei!
Guardamos todos os materiais de limpeza e Alex devolveu os carros à garagem.
- Quem quer dar uma volta de Audi? – Alex perguntou depois de terminar o serviço.
- Já estou dentro. – Max respondeu.
Todos correram para o conversível de Alex. Sentei ao lado do motorista, enquanto Gabi e Luiz se espremiam ao lado dos músculos de Max no banco de trás. Andamos por todo Alphaville. Max ficou de pé, aproveitando o vento, depois tirou a camiseta e começou a zombar das pessoas na rua.
- Deixa de ser infantil, Max. – Alex reclamou.
- Me deixa! – ele protestou, girando a camiseta no ar e exibindo os músculos. Reparei nas garotas que ficavam loucas.
- Vou te deixar...Caído no asfalto se não parar.
- Você parece uma mariquinha. – Max reclamou, sentando no banco – A festa da Bia foi melhor que a sua. Pelo menos tinha uma loirinha sexy.
Caí em gargalhada. Na minha festa de aniversário Max ficou interessado em Fernanda, mas estava com muito sono para conseguir falar com ela, desde então não a viu mais.
- Verdade, Max. A Nanda não estava. – observei – Nem ela nem Marcos.
- Ele está interessado na Nanda? – Alex zombou.
Ignorei a conversa entre os dois. Eu lembrava que Marcos falara que não iria a festa, mas Fernanda estava animada para ir. Na escola eu falaria com ela.
Estávamos sentados em minha cama. Ele brincava com uma mecha de meu cabelo, enquanto eu encarava seus belos olhos negros. Minha casa voltara a ser um lugar tranquilo, já que Gabi estava na casa de Alex. Fazia minutos que permanecíamos naquele silêncio, mas para que falar se apenas olhar já nos satisfazia?
Um filme se passava em minha cabeça. Uma sala de aula; uma menina desligada tentando encontrar um NERD em sua turma do segundo colegial; um garoto extremamente lindo, com um corpo esbelto e ao mesmo tempo musculoso, um cabelo claro e os olhos bem desenhados em seu belo rosto másculo. Depois a primeira vez em que a menina ouviu a voz do garoto: tão grave, tão linda, tão apaixonante. E o primeiro beijo deles, no quarto dele.
- Consegui um emprego. – Alex rompeu o silêncio.
- Onde? – perguntei naturalmente.
- No Valentyne’s Bank.
Sentei na cama abruptamente. Ele também se levantou, mas mais por susto do que por desentendimento.
- Fazendo o quê? – perguntei com uma voz mais alterada.
- Sua mãe fez ótimas recomendações de mim, então Roberto decidiu me contratar para ficar no atendimento. Ele falou que sou perfeito para isso. E vou ganhar bem, o suficiente para pagar uma boa universidade.
- É estranho o Roberto te contratar. A até pouco tempo atrás ele nem te conhecia.
Ele concordou com a expressão confusa. Voltamos para as antigas posições: ele brincando com meu cabelo e eu encarando seus belos olhos negros.
- Está na hora de ir embora. – ele falou – Vai sair amanhã?
- Acho que vou almoçar com meu pai. Vamos comigo?
- É um almoço de família. Não sei não.
- Você já é parte da minha família.
- Tudo bem, eu vou.
Ele meu deu um beijo tranquilo e nós descemos para o jardim. Esperei até que ele saísse com Audi para entrar. Minha mãe já estava dormindo, então fui dormir também.
Eram onze da manhã quando Alex e eu íamos para Cotia – a cidade em que meu pai morava. Estávamos em seu novo carro. O Astra agora pertencia a Gabi. O celta tinha se aposentado. A capota do Audi estava fechada, embora estivesse calor, mas eu não estava a fim de bagunçar o cabelo.
Chegamos a Granja Viana em alguns minutos depois de sair. O Audi não tinha tanta potência quanto meu BMW, afinal, de que adiantaria o carro ser potente se Alex não usaria isso?
- Uau! – Alex elogiou.
A casa era extremamente linda. Toda branca, com várias paredes de vidro, normalmente onde deveria ter uma janela; o gramado completamente verde rodeava a mansão até a piscina.
Descemos do carro e tocamos a campainha. Foi uma das empregadas quem atendeu. Ela nos falou para entrar. Paulo esperava atrás dela para nos ver, seu sorriso era intenso.
- Que bom que vocês vão passar o domingo todo comigo. – ele falou me abraçando.
- Não me aguentava de tanta saudade. – falei.
Ele e Alex se cumprimentaram.
- De quem é aquele Audi maravilhoso? – Rodrigo surgiu na imensa escada – Bia!
Ele correu pela escada e me abraçou, depois cumprimentou Alex. Parecia que Rodrigo não sentia aversão por meu namorado, talvez tivesse realmente aceita-do a ideia de ser meu irmão.
O almoço foi pacífico. Meu pai perguntara se Alex gostara do presente, depois falávamos sobre assuntos que surgiam de repente.
À tarde Alex e Rodrigo disputaram uma partida em um jogo de vídeo game, depois se jogaram na piscina. Paulo e eu assistimos a disputa de vídeo game e depois lanchamos, enquanto eles se esbaldavam na piscina.
- Então, filha, para qual curso você vai prestar o vestibular? – Paulo perguntou quando lanchávamos.
- Pretendia fazer educação física, mas acho melhor fazer medicina. Era o seu sonho, não era?
- Não quero que faça as coisas pensando em mim, já fui egoísta demais com você.
- Mas estou me interessando pela área. Antes de realizar qualquer sonho preciso ganhar dinheiro e a medicina é perfeita para isso. Sem falar que a sensação de salvar uma vida deve ser maravilhosa.
- E quando vai fazer a prova?
- Acho que só no próximo semestre. Naqueles dias que fiquei de licença perdi muitas aulas, então vou ficar para recuperação, e com isso vou perder as provas do primeiro semestre.
- Mas vai fazer a formatura?
- Sim. Porém ainda não pego o certificado de conclusão do ensino médio, só quando terminar as aulas de recuperação.
Ele assentiu.
Voltamos para casa tarde da noite. Alex estava com seu ombro todo vermelho, por conta das queimaduras solares – eles nadaram sem o protetor solar.
- Amanhã é o meu primeiro dia em um emprego. – ele comentou enquanto parava o carro em frente a minha casa.
- Então boa sorte. – tentei parecer animada.
- Obrigado.
Ele pegou meu queixo com o polegar e o indicador, logo seus lábios tocaram os meus. Senti suas mãos irem até minhas costas e um arrepio subir por minha coluna. Quando nos separamos ele estava ofegante.
Cambaleei para fora do carro e entrei em casa, imediatamente Alex foi embora.
Havia muitos deveres de casa para o outro dia. Já estávamos no fim do ano, então a cota de lição se multiplicou. Fiz sem alguma pressa, depois fui tomar banho para dormir. Peguei um livro para tentar trazer o sono, mas ainda não conseguia dormir.
Carla perguntara sobre meu dia com Paulo Ricardo e me contou sobre o passeio que deu no parque com Roberto. Zombei dela, falando que ela foi apressada em me arrumar um padrasto, mas por trás da negação os olhos dela concordavam.
Tentei me concentrar na leitura. Mergulhei na pequena cidade de Fell’s Church. Imaginei-me no lugar da personagem Elena Gilbert, a garota mais popular do colégio. Ela vive um péssimo momento quando percebe que só tem olhos para Stefan, o novo garoto da escola. Ele é misterioso e às vezes assustador. Quando os dois finalmente ficam juntos Elena descobre: Stefan Salvatore é um terrível vampiro.
Imaginei o que eu faria se descobrisse que Alex estava matando pessoas, roubando suas essências e desejando violentamente meu sangue. Estremeci, mas seria uma grande adrenalina.
Fechei o livro e comecei a encarar a capa assustadora. Tinha um rosto desenhado pela metade, com manchas de sangue ao redor da boca e ao lado escrito: Diários do vampiro, de L. J. Smith. Larguei-o em cima do criado-mudo e tentei dormir.
O colégio já estava cheio quando chegamos. Alex me seguia com seu Audi, enquanto eu procurava uma vaga para meu BMW. Estacionamos um pouco longe do prédio principal. Andamos de mãos dadas pelo pátio até a sala de aula – que já estava aberta.
A professora ainda não chegara, então não fomos impedidos de entrar. Sentamos juntos, na mesa de sempre. A professora de história geral, Denise, entrou toda apressada.
- O ano está terminando e vocês ainda não finalizaram as notas em minha matéria. Terei de passar um trabalho urgente.
- Outro. – Alex reclamou ao meu lado.
Era estranho ver ele reclamando, principalmente por causa de um trabalho. Ele gostava de estudar, não gostava?
- Terei de selecionar as duplas, já que não posso confiar nas parcerias que fazem. – a professora falou.
- Acha que ela vai nos deixar juntos? – sussurrei para Alex.
- Há uma possibilidade. – ele respondeu – Mas se ela não deixar não vai fazer diferença, é só um trabalho.
- Lembra da última vez que fiz trabalho com um estranho?
- Sim. Você largou seu namorado perfeito para ficar com esse estranho.
- E me apaixonei por ele.
- Por isso que não há problema. Não dá para se apaixonar por outro tão rapidamente.
- E quanto a você? – falei provocativamente.
- Relax! – ele respondeu zombando.
- Muito bem, turma. – a professora chamou a atenção de todos – O trabalho é complicado, por isso será em dupla.
Ela começou a falar os nomes. Fiquei atenta até ela falar o meu:
- Bia, fará dupla com Caio.
Senti minha expressão desmoronar.
- Ah! – foi o máximo que falei.
De longe Caio ria de meu desapontamento. Não queria fazer trabalho com o namorado da minha amiga. Queria o meu namorado.
- Alex, - a professora falou – você fará dupla com Suzana.
Desta vez foi minha boca quem desmoronou, ela ficou escancarada. A loira, barbie, vulgar e perfeita Suzana? Claro que não!
Ele não aceitaria isso! De jeito nenhum! Nunca!
Do outro lado da sala eu via Suzana com um sorrisinho de satisfação. Se ela não tirasse aquele sorriso da cara eu mesmo o tiraria, e a cara dela não ia gostar nada da marca que eu deixaria.
- Você vai falar com a professora no final da aula. – murmurei para Alex.
- Por quê? – ele perguntou surpreso.
- Porque você não fará trabalho com a vulgaridade em pessoa. – respondi sem qualquer sinal de sarcasmo.
- Quer deixar de ser ciumenta? Já é paranoia.
- Ugh! – bufei.
Todos começaram a trocar seus lugares para sentar com o parceiro de trabalho. Alex se levantou e foi sentar com a loira oferecida, enquanto Caio assumia seu lugar ao meu lado.
- É impressão minha ou você não gostou de fazer dupla comigo? – Caio perguntou.
- Não gostei do Alex fazer dupla com aquela nojenta. – cuspi a palavra.
Ele riu.
Começamos a combinar como faria o trabalho. Sugeri que ele fosse a minha casa, mas depois mudei de ideia e falei que iria a casa dele, assim deixaria Alex um pouco irritado. Caio aceitou e assim fechou nosso combinado.
Depois das aulas fui trabalhar. Alex fez o mesmo e estava todo nervoso para seu primeiro emprego. O Valentyne’s Bank não ficava muito longe da Marshel’s academia, então não ficaríamos sem nos ver.
O período de folga dele era o mesmo que o meu. Isso ele tinha negociado com Roberto, já que era estudante e precisava de um período de folga maior do que só aos fins de semana.
O movimento na academia foi tranquilo, como era em todas as segundas-feiras. Matheus não apareceu na loja, então a pequena loja em Alphaville estava mais movimentada do que o normal. Claro! As férias estavam chegando. Todos queriam garantir seu corpaço para o verão sem precisar ficar indo a uma academia.
Depois do serviço, passei no banco dos Valentyne. Alex trabalhava intensa-mente no balcão. Ele estava tão lindo de roupa formal. Parecia cinco anos mais velho. Um verdadeiro Deus grego.
Em casa caí de cara nos travesseiros. Nem tinha jantado direito, de tanto cansaço.
A casa de Caio era simples. Era grande, mas com apenas um andar. Era tão bem decorada que me deixava pasma. Os pais dele não estavam, então eram apenas nós dois e uma empregada.
Ele já tinha feito a pesquisa, isso significava que agora era copiar as várias páginas que ele encontrou. A letra de Caio não era tão linda quanto à de Alex, mas era melhor do que a minha.
- Por que você não enfrenta o pai da Iza e pede ela em namoro? – tentei puxar assunto.
- É ela quem não quer. Fala que tem medo do pai, mas às vezes acho que não quer se prender de vez comigo.
- Mas ela gosta de verdade de você.
- Só que ela nunca olhou para mim do jeito que você olha para o Alex. É tão diferente seu olhar nele, parece que está olhando uma joia rara. E ele olha para você como se você fosse uma deusa.
- Cada um tem seu jeito de gostar. – respondi corando.
- Mas vocês são intensos.
- É estranho ouvir isso de um garoto. Vocês normalmente não são machistas?
- Quando se está apaixonado tudo muda. – ele respondeu olhando para mim.
Depois do trabalho com Caio comecei a dirigir para minha casa. Caio morava a duas quadras da casa de Alex, então aproveitei que já estava na rua da casa dele para parar. Tinha um Mercedes conversível vermelho parado em seu jardim.
Ótimo! A vulgar estava na casa dele.
Só precisei tocar a campainha uma vez para Alex mandar entrar. Os encontrei na mesa da sala de jantar, com vários papeis rodeando-os.
- Ainda não terminaram? – perguntei de mau-humor.
- Estamos adiantando bastante, já que só teremos dois dias para fazer este trabalho. – Alex respondeu.
- Suzana é tão ocupada que não pode adiantar na casa dela?
Sentei na cadeira ao lado de Alex. Ela estava de frente para nós. O rosto sereno, mas o olhar faiscava.
- Também trabalho. – ela respondeu com sua voz desenvolvida.
- A é? Onde? – perguntei, cruzando as mãos no queixo.
- No shopping.
- Qualquer dia desse eu te visito lá. – não foi uma promessa de cortesia, foi uma ameaça. Ela pareceu perceber.
- Acho que está tarde. – ela falou, os olhos me fuzilavam.
- Para você sim. – dei um sorriso malicioso.
- Bia! – Alex me advertiu.
- Não Alex. Tudo bem. – ela respondeu, pegando a bolsa e saindo.
- Isso não foi educado. – Alex falou me fitando.
Dei de ombros e cruzei os braços. Pareci uma criança birrenta. Mas e daí? Aquela loira vulgar estava dando em cima do meu namorado. Não. Namorado não. Noivo. Quem não faria birra?
Alex começou a juntar os papeis de seu trabalho. Fiquei imóvel na cadeira, esperando ele falar alguma coisa. Eu não daria o braço a torcer. Depois que as folhas estavam todas empilhadas debaixo de seu braço ele falou:
- Vamos lá em cima. Temos uma conversa séria.
Levantei sem encontrar seu olhar. Segui-o até o quarto, depois sentei na beira da cama. Ele puxou uma cadeira, que ficava no rack de seu computador, e se sentou de frente para mim.
- Me explica o que foi aquilo. – ele pediu.
- Aquilo o quê? – perguntei sem humor algum.
- Por que tratou a Suzana com tanta frieza?
- Não gosto dela.
- Mas acontece que eu tenho que fazer este trabalho com ela, e essa rivalidade que você está criando só dificulta tudo.
- Rivalidade que eu estou criando? – perguntei incrédula.
- Sim. Você. Ela não te fez nada.
- Ela está dando em cima de você!
- De onde você tirou isto? – ele se recostou na cadeira.
- Desde o primeiro dia em que entrou naquela escola ela está dando em cima de você. Eu ouvi uma conversa dela com algumas meninas: Ela te quer!
- Mas não vai ter. – agora ele se inclinara para mim.
- Como tem tanta certeza disso? – perguntei entre dentes.
Alex se levantou abruptamente e ficou de costas para mim.
- Me dê um motivo para preferir ela e não a você. – ele parecia relutante em controlar o tom de voz.
- Ela é linda, perfeita, todos a desejam e está dando em cima de você.
Ele se virou e avançou até mim. Pegou em meus pulsos, sem apertá-los, e colocou a rosto a centímetros do meu.
- De que adianta ela ser linda se não tem a beleza que me atrai? – ele perguntou entre dentes – Para que eu vou querer uma loira se tenho a morena mais linda do mundo? Por que eu cobiçaria aqueles olhos verde-água se são os castanhos que me atraem? Qual motivo me levaria a querer alguém tão alta quanto eu se gosto das que alcançam meu queixo? Como poderia desejar um corpo todo curvado se gosto dos mais baixos e irregulares? – ele parou por um tempo, depois recomeçou: – Por que eu escolheria a Suzana se amo você?
Ficamos em silêncio por um longo tempo. Ele ainda segurava meu pulso, mas agora seu rosto estava suplicante.
- As pessoas mudam. – murmurei.
Sua expressão mudou. Da suplicante para a chocada.
Percebi que eu estava tentando fazê-lo culpado, mesmo sabendo que a reação exagerada era minha. Meu ego falava mais alto que a razão. Isso é comum quando a gente não quer admitir que perdeu. Mas com Alex? Eu não deveria ser tão orgulhosa com Alex. Ele era o único que me entendia de verdade, por que eu estava tratando-o como alguém que não merecia minha rendição?
Ele soltou meus braços e suspirou, depois tirou a aliança de rubis pintados de azul escuro e largou em cima da escrivaninha.
- Não é pela Suzana que eu uso este anel. – ele falou de costas para mim – Vou tomar banho.
Ele abriu a porta do closet e se fechou lá dentro. Desabei em sua cama. Por que estava brigando com ele? Sentia-me uma idiota.
Fitei o anel azul que ele largara. Era alucinação ou tudo estava terminado? Minha garganta ardia com o choro preso.
Alex surgiu com as roupas que tirara na mão e uma toalha enrolada na cintura. Não olhei para cima enquanto ele passava na minha frente. Ia esperar ele entrar no banheiro e ia embora, deixando o valioso anel de noivado para trás. Mas Alex parou na porta. Senti seus olhos em mim, embora não tivesse coragem de olhar em seu rosto.
Já que ele não ia sair da porta eu teria que sair naquele instante. Levantei da cama num rompante e comecei a me mover até a porta. Ele bloqueou minha saída com o braço. Fiquei parada, fitando seu braço a minha frente.
- Não é com ela que eu vou me casar a daqui cinco anos. – ele falou.
Ouvi com muita clareza o verbo no futuro: vou. Àquela altura já estava esperando ouvir tudo no passado.
Finalmente virei para encarar seus olhos. Estavam assustados, o medo era explicito em sua expressão. Ele sabia que eu pretendia ir embora.
Foi o que bastou para me fazer desabar as lágrimas em seu peito. Ele me abraço, afundando o rosto em meus cabelos. Tropecei em meus soluços enquanto Alex relaxava os ombros rígidos.
- Te amo. – ele suspirou.
Estava tão afogada nas lágrimas que não consegui responder. Brigar com Alex era a pior ideia que eu poderia ter. Era insuportável.
Passei meus braços ao redor de seu peito nu e o apertei contra mim.
- Não quero te ver chorando. – ele falou, levantando meu queixo.
Enxuguei as lágrimas.
- Vai tomar banho. – falei por fim.
Ele riu em minha orelha e me empurrou para encarar meu rosto.
- Está me xingando ou mandando eu tomar banho mesmo?
- Um pouco dos dois. – respondi me afastando – Vou estar na sala.
Ele seguiu para o banheiro, enquanto eu descia para o primeiro andar. Sentei em um dos sofás da sala e liguei a TV. Estava passando o noticiário. O ancora falava sobre um recente sequestro. A notícia me fez lembrar dos meus dias naquela casa, com os quatro homens mandados por Gisele Stoff. Os pensamentos me levaram até Pedro Stoff, o irmão de Gisele que participou do meu sequestro e acabou morrendo.
Será que ela não sentia saudades dele? Ela era tão fria que nem a perda do irmão – que era por sua culpa – a fazia se sentir intragável?
Pedro tinha orgulho da irmã. Era apenas um menino que contemplava a única irmã mais velha. Para ele, Gisele era a heroína. E essa admiração toda, esse amor todo acabou levando-o a morte. Uma morte cruel e sem quem lamentasse por ela.
E Rone? Este também a idolatrava, mas abriu seus olhos antes que se afundasse mais no perigo. A morte de Pedro o havia comovido e visto ver o quanto Gisele não se importava com alguém além dela mesma
Gilson e Leo foram presos, mas não tinham algum laço afetivo com a psicopata. Apenas se preocupavam com o dinheiro que eles recebiam por cada serviço sujo.
Tentei me livrar dos pensamentos obscuros e me concentrar nas notícias. Por pura coincidência o ancora do jornal também se lembrou da psicopata:
Falando em sequestro de adolescente, a acusada de sequestrar a filha do empresário Paulo Ricardo Vasconsellos, Gisele Stoff, foi dita vista na Flórida, EUA. Mas nenhuma prova concreta.
A garota parece estar tentando brincar com a polícia. Senhor Vasconsellos diz disposto a ajudar nas buscas.
O som dos passos de Alex na escada me distraiu. Ele se encostou atrás do encosto do sofá. Os cabelos pingavam nos ombros. Eu estava com as pernas cruzadas em cima do sofá, os olhos grudados na televisão.
- Disseram que viram Gisele na Flórida. – falei.
Ele apoiou o braço no sofá e saltou por cima do encosto, parando em cima de mim, apenas seu cotovelo evitava que ele caísse em cima de mim.
- Isso é bom. Não é? – ele perguntou.
- Talvez.
Seu corpo estava a apenas alguns centímetros do meu, coberto somente por uma toalha. Ele se curvou para me beijar.
- Onde está todo mundo? – perguntei involuntariamente.
Estando assim com ele, me lembrei que estávamos sozinhos. Estava tão brava com ele na hora em que cheguei que nem havia notado isso. Normalmente, Amanda estaria em casa, e agora Gabi também.
- Meu pai está trabalhando, como sempre, e minha mãe foi ao shopping com a Gabi. – Alex respondeu, seus lábios ainda nos meus.
Escorreguei a mão para seu pescoço enquanto ele me apertava contra si. Senti suas mãos entrarem por meu sobretudo. Um arrepio involuntário subiu por minha espinha.
Alex pulou subitamente quando a porta da frente se abriu. Foi mais por susto do que por medo do flagra. Era Gabi, com as mãos ocupadas por sacolas. Seu rosto ficou rubro quando nos viu.
Imaginei o que ela estava pensando. Eu e Alex deitados no sofá, ele só de toalha e o susto de nós dois quando ela chegou.
- A sala não é o melhor lugar para isso. – ela disse envergonhada.
- Não estávamos fazendo nada. – Alex respondeu constrangido.
Senti meu rosto assustadoramente quente – sem dúvidas eu estava mais corada do que nunca. Sentei antes que Amanda pudesse surgir na porta com o resto das sacolas.
Ela me fitou, examinando meu rosto rosado, depois se virou para Alex, olhando o rosto dele igualmente corado e seu corpo seminu.
- O que estavam fazendo? – ela perguntou.
- Ah, francamente, mãe. – Gabi reclamou - Você ainda pergunta? Não quero nem ouvir.
Gabi correu pelas escadas até o segundo andar.
- Não estávamos fazendo nada. – a voz de Alex era convincente.
- Depois a gente discuti sobre isso. – ela falou subindo as escadas.
Meu rosto ficou mais quente ainda.
- Ela vai brigar com a gente? – perguntei.
- Na verdade, vou poupar você disto. Pode embora.
- E ser uma covarde?
- Ela só vai me passar um sermão. Você não merece escutar. Teremos, de novo, a conversa; meu pai chegará no meio deste sermão e vai participar também, e depois que minha mãe sair ele vai entregar um pacote de camisinha que eu vou jogar na gaveta junto com as outras que ele me deu.
- Isso já aconteceu antes? – notei que ele sabia cada detalhe do que ia acontecer.
- Sim. Acontece com frequência desde quando minha mãe passou a nos ouvir atrás da porta e às vezes ela ouvia nossos beijos.
- Ai que mico. – afundei meu rosto na mão.
- É melhor você ir embora. É constrangedor demais.
- É isso que vou fazer.
Arrumei meu sobretudo e me curvei para beijar seus lábios. Ele correspondeu rapidamente, depois saí.
Comecei a rir comigo mesma pela situação enquanto dirigia de volta para a minha casa.
Comentem o capítulo ali embaixo!
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