4- NOVOS AMIGOS
Saí da escola e fui direto para a casa da Gabi para fazer o convite do cinema. Cheguei lá e me assustei.
Todos estavam embalando as coisas da casa em umas caixas e as malas paradas perto da porta.
- O que está acontecendo? – perguntei enquanto chegava perto de Gabi.
- Recebi uma bolsa de estudos na universidade da Inglaterra. Estamos indo para lá. – ela respondeu.
- Que bom. – respondi.
Fiquei feliz por aquilo. Ela iria estudar na Europa, esse era o sonho de milhões de estudantes. Só que algo estralou em minha cabeça. De repente tudo desmoronou em mim. Perdi minha melhor amiga também?
- O que você queria me falar? – perguntou ela me abraçando.
- Queria saber se você quer ir ao cinema com a minha turma. – percebi que minha voz voltava a ficar sem vida.
- Hoje?
- É.
- Vamos. Para me despedir. Só vou embora amanhã mesmo.
- Ta. – falei com pouco entusiasmo.
Saímos e fomos conversando para o cinema. Eu ainda estava chateada por perder minha melhor amiga. Agora sim, ele ia sumir da minha vida de uma vez, já que a única lembrança se fora. Gabi era a única prova que eu tinha de que ele havia feito parte de minha vida. E agora ela ia me deixar também.
Fomos no Celta dela. Respirei fundo, para guardar aquele cheiro. Visualizei bem, para não esquecê-lo. E principalmente, fitei o rosto maravilhoso de Gabrielli, assim eu me lembraria dela por mais tempo...E de Alex também, já que eles eram superparecidos.
Meus velhos amigos gostaram de Gabi. Mas quem não ia gostar, ela era um encanto de pessoa.
Assistimos a uma comedia romântica. A hora passou rápido, quando eu desejava o contrário. Andamos até minha casa e ela se despediu:
- Prometo te ligar sempre. Vai lá em casa amanhã?
- Claro, bem cedo. – abracei a chorando.
Entrei em casa enxugando as lágrimas. Minha mãe me seguiu e perguntou:
- O que aconteceu meu amor?
- A Gabi também vai embora!
E desabei em choro no seu colo aconchegante. E mais uma vez, dormi sem perceber.
Acordei cedo no outro dia e corri para a casa de Gabrielli. Eles já estavam com as malas no carro.
- Gabi! – gritei – Adeus!
- A Bia! Promete se cuidar? – pediu ela chorando.
- Só se prometer que nunca vai me esquecer.
- Mas é claro. Agora tenho que ir.
- Espere! – pedi segurando seu braço – Você vai voltar não é?
- Não sei. – sua voz estava distante – É muito tempo de escola. Não sei quando ou se volto.
- Adeus! – eu já chorava.
Eu a abracei forte tentando fazer com o que ela ficasse, mas foi inútil. Ela me soltou facilmente e entrou no carro. Me despedi dos pais dela e eles se foram.
Fiquei sentada naquele gramado, pensando que parecia tudo planejado, eu perder todos aqueles que amo. Refleti naquela frase e de repente, tudo fez sentido: A briga de Alex e Rodrigo, a partida dele, o telefonema de aviso, a ameaça de Rodrigo, a partida da Gabi e... Claro... O chaveiro que achei naquele gramado.
Saí correndo pela rua até minha casa. Bati a porta da frente com força e disparei para o meu quarto. O chaveiro estava na gaveta da minha escrivaninha. Olhei-o e tive a certeza. Aquele símbolo era de uma marca de carro caríssima. De um Porsche. Era da chave do carro de meu pai. Do Porsche Carrera GT.
- Pai! Pai! – gritei enquanto descia as escadas.
Ele e minha mãe apareceram assustados na sala.
- O que foi minha filha? – perguntou ele cinicamente.
- Por que fez isso comigo? O que você ganhou com isso?
Parei de frente para ele, mas ainda sim gritava.
- Não estou entendendo. Do que você esta falando?
- Disso pai. – falei mostrando o chaveiro
- O que tem isto, Bia? – perguntou minha mãe, a única inocente nessa histó-ria.
- Mãe! O pai ameaçou o Alex e pagou uma bolsa para a Gabi fora do país, só para eles irem embora.
Minha mãe olhou sério para meu pai.
- Você não fez isso. – insinuo minha mãe olhando para meu pai.
- Claro que não! Menina louca. – protestou meu pai.
- Este chaveiro é seu pai, é o símbolo da marca Porsche, e você tem um Porsche. Eu achei na casa do Alex, depois da Gabi ir embora. Por que fez isso?
- Não sou o único a ter um carro desses.
- Mas dois dias antes do Alex ir embora, você e o Rodrigo falaram com ele e você saiu com o Porsche – falei bem alto – logo em seguida. No outro dia, ele me ignorou e depois foi embora sem explicações.
Paulo me olhou sério e finalmente assumiu:
- Aquela gente não deve ficar perto de nós. Eles são baixos. Você deve ficar com Rodrigo, não com ele.
- A única pessoa baixa aqui é você. – falei com nojo – E o Rodrigo também.
- Olha como fala comigo garota.
- Pai, todo o respeito que eu tinha por você, se perdeu neste momento.
Retirei-me da sala e fui para meu quarto.
Minha mãe ficou na sala com meu pai, discutindo.
Naquela hora, não tinha ninguém ali comigo, para me consolar. Decidi sair de casa. Já havia aguentado muito ali, queria sair.
Mas para onde eu poderia ir? Na casa da Iza? Não, era difícil ver ela e Caio juntos, me sentia machucada e também, ela morava perto demais, iria dar no mesmo. Na casa da Nani? Também não, era perto demais de casa, também, não ia fazer diferença. Na casa de Nanda? Claro. Peguei meu celular e liguei diretamente para ela.
- Alô? – atendeu ela.
- Nanda? É a Bia.
- Oi Bia, o que foi?
- Posso ficar uns dias ai na sua casa? Até arrumar outro lugar?
- Por quê?
- Briguei com meu pai e não quero ficar nem mais um minuto aqui.
- Logo vocês fazem as pazes.
- Não Nanda, nunca vou perdoá-lo pelo que fez.
Contei toda a historia para ela.
- Claro pode vir! Quando você vem?
- Hoje à tarde.
- Ta bom. Estou te esperando.
Ela desligou.
Eu estava arrumando as malas quando minha mãe apareceu e se espantou em ver as malas na beira da porta e meu guarda-roupa vazio:
- O que significa isto Beatriz?
- Vou embora. Não se preocupe comigo, já sei onde ficar e o que fazer.
- Bia, seu pai não fez por mal. Ela achou que estava fazendo o bem para você.
- Mas você esta vendo eu bem, mãe? Ele me machucou muito. Nem inimigo faria isso.
Ela abaixou a cabeça e parecia envergonhada.
- Não é culpa sua, mãe. Eu só quero um tempo para pensar.
- Ta bom minha filha. Eu confio em você. Sei que vai se sair bem.
- Obrigada mãe! – abracei-a.
Peguei minhas malas – principalmente meu amado skate – e saí.
Cheguei na casa de Nanda alguns minutos depois, – fui de táxi – ficava longe de onde eu morava, por isso era o lugar ideal para fugir de meu pai.
Ela me esperava animada na porta.
- Que bom que você ficará por uns dias aqui! Será divertido.
- É. – eu não estava tão animada quanto ela.
Nanda não morava com os pais, ela dividia a casa com dois primos e quatro amigos. Era uma casa grande e bem animada com tanta gente, mas assustadora quando se está sozinho.
Ela me levou até meu novo quarto. Ficava no segundo andar, bem no fim do corredor. E depois me apresentou aos outros moradores:
- Gente, essa é Bia, minha amiga! Bia esses são: Matheus – ele era bonito e tinha os cabelos na mesma cor de Alex; Leandro – ele já era menos bonito, tinha os cabelos escuros e era um pouco gordo; Luana – tinha o cabelo longo até metade das costas, pretos e bonitos, mas o rosto pálido a desvalorizava; Amanda – era bonita, com os cabelos curtos até o pescoço, liso e cor de caju; Marcos – loiro de cabelos arrepiados, os olhos azul-esverdeados chamavam atenção, ele era lindo – e Laura – bem moreninha e os cabelos negros faziam cachos até metade dos ombros.
“Matheus e Amanda são meus primos. Leandro, Luana, Marcos e Laura são meus amigos que vieram para São Paulo para estudar ou trabalhar. Todos aqui têm entre 18 e 21 anos”.
- Prazer! – falei por fim.
- Seja bem vinda! – falou Laura com uma educação familiar.
- Será muito bom ter alguém nova por aqui. – argumentou Marcos, os olhos cintilando com a luz. Que beleza máscula!
- Obrigada pela recepção. – agradeci timidamente.
Todos riram!
Voltei ao meu quarto para arrumar as roupas no lugar certo e Nanda me seguiu.
- Então, gostou do pessoal? – perguntou ela.
- Adorei, são bem simpáticos.
Embora só Laura e Marcos tenham falado comigo. Mas eu sentia que seria muito bom ficar ali.
- Ótimo. Sinta se à vontade.
- Ta.
Estava com medo de descer na sala e ter que ver todos aqueles olhares em mim outra vez – eu odiava isso, – mas tive que ir. E não deu outra, todos estavam me esperando no sofá para conversar comigo.
Contei a eles tudo sobre minha vida e os motivos que me levaram a fugir de casa. Ficamos por horas sentados conversando, até Fernanda nos chamar para jantar. Ela era a única que não estava na conversa, já que sabia de tudo sobre mim, então foi fazer o jantar.
A cozinha era grande e bonita, com uma enorme mesa, típica de casa com muita gente. Todos se sentaram, eu fiquei entre Luana e Leandro. Foi agradável o jantar com eles, ficamos conversando durante boa parte da refeição. Depois ajudei Laura a lavar louças.
- Então, todos dividimos as tarefas aqui. – falou ela rindo. – Você, terá que entrar na dança também.
- Claro, se vou ficar aqui tenho que ajudar. O que posso fazer?
- Bom! Eu fico com a cozinha e os quartos dos meninos – ela fez uma cara de repulsa – e não tenho ajudante. Você pode me ajudar, que tal?
- Pode ser. Aceito qualquer coisa. Mas acho que tenho que ajudar nas despesas também.
- Mas você tem algum emprego?
- Pior que não! Vou procurar, quem sabe não encontro.
- Os pais do Matheus têm uma loja aqui na cidade. Ele é o gerente e quem sabe não arruma um emprego para você.
- Não sei, e se ele não gostar?
- Eu vou adorar. – Matheus apareceu na cozinha e falou, pegando uma maça em cima da mesa e devorando – Estamos precisando e uma nova recepcionista e você é perfeita.
- Mas eu nunca trabalhei antes e não sei lidar muito bem com o público. – falei com um ar de vergonha.
- Não se preocupe, te explicarei tudo. Enquanto ao público, relaxa, você é bonita e os clientes querem isso, uma atendente bonita e simpática. – falou ele.
- Obrigada.
- Te levarei lá amanhã para você conhecer e depois você diz se quer trabalhar ou não.
- Ta bom.
Depois daquela conversa maluca de trabalho eu fui dormir. Estranhei ir deitar sem o beijo de minha mãe, mas dormi assim mesmo.
Enquanto esperava o sono chegar fiquei pensando: Como Matheus poderia ser tão parecido com Alex? O cabelo igual, os olhos, a educação, o humor e a responsabilidade. Só reparei nele no meu primeiro dia lá e só consegui ver semelhanças nele com Alex. Isso me perturbou a noite inteira.
Acordei cedo no outro dia, com o barulho do pessoal levantando. Fui para a cozinha tomar o café da manhã, quando Matheus me parou, falando:
- Saímos daqui a meia hora, ta bom?
- É mesmo, pode deixar, me arrumo a tempo. – falei.
- Já Matheus? Ligeiro! – falou Leandro com um sorriso malicioso.
- Deixa de ser besta. – falou ele já corando – Estou arrumando um emprego para ela.
- Arrã! – acrescentou Leandro.
Saí de lá corando.
Cheguei na cozinha e Laura estava preparando o café.
- Quer que eu ajude? – perguntei tentando ser gentil.
- Hoje não precisa. Vai se arrumar para ir a loja com Matheus.
- O.K.
Peguei uma bolacha e voltei para meu quarto. Assustei-me quando entrei. Amanda estava lá, já arrumando.
- Te assustei? Desculpe!
- Foi nada não, é que eu não estava esperando.
Ela riu.
- Então, você é responsável pelos quartos das meninas? – perguntei.
- É, arrumo e limpo todos. Quer que eu saia para você se trocar? – ela falou com educação.
- Não precisa. Irei me trocar no banheiro, aproveito e tomo um banho.
- Vai antes do Marcos ir lavar.
- Ta, fui. – saí correndo.
Cheguei lá antes de ele começar a lavar.
Tomei um banho rápido e saí. Matheus já estava no carro me esperando. Era um Mercedes conversível, preto. Fui apressada em direção ao belo carro e saímos.
Ele andava muito rápido com o carro, muito mais que Rodrigo.
- Quer que eu ande mais devagar? – perguntou ele educadamente.
- Não, está tudo bem. – menti.
- Sei. Você está com uma cara de assustada. – disse ele imitando minha expressão.
Ele reduziu um pouco, mais ainda continuou rápido. O vento fazia meu cabelo voar. Esse era o único motivo para eu não gostar de conversíveis, desorga-nizava o cabelo.
Chegamos rápido à loja. Era pequena, vendia artigos de academia; pesos, bicicletas, esteiras; tudo de academia. Isso dava para ver na cara de Matheus – ele parecia atleta de tão disposto que era. A loja parecia ter apenas três empregados.
- Essa loja não é pequena para ter um gerente? – falei rindo.
Ele soltou uma risada alta.
- Não sou bem gerente. – ele falou me puxando para dentro da loja – Eu fiscalizo e pago os funcionários daqui, meus pais moram longe então eu cuido das coisas por aqui.
- Ata. E você recebe por isso?
- Mais ou menos. Ganho uma mensalidade para a minha faculdade e às vezes um presentinho.
- Presentinho? – perguntei maliciosa.
- É. Por exemplo, aquela belezinha lá. – ele apontou para o Mercedes.
- Que presentinho, hein! – falei rindo.
Estávamos na recepção quando ele começou a me explicar tudo. Não era muito difícil de aprender, então aceitei o emprego.
- Pode começar hoje depois do almoço! – disse ele.
- O.K.
Voltamos a casa para o almoço. Todos estavam me recebendo bem, mas eu ainda não tinha conversado com Luana. Tentei puxar assunto no almoço, mas não obtive sucesso.
Quando terminamos o almoço corri ao meu quarto para me arrumar e ir para o novo e primeiro emprego. Eu estava feliz, entusiasmada, por ir trabalhar, quando Marcos interrompeu meus pensamentos.
- Então, já conseguiu um emprego?
Ele estava imóvel em frente à porta. Uma bela obra de arte.
- Sim. Meu primeiro emprego. – falei feliz.
- Parabéns. – disse ele. – E bom trabalho!
- Obrigada. – senti minhas bochechas quentes, com certeza estava rubra.
Seus olhos me encantavam. Penetrei neles de uma forma ridícula, ele achou que eu estava encarando-o.
- O que foi? Falei algo que não deveria?
Demorei a responder, e antes que fizesse papel de tonta respondi:
- Não! É que amei seus olhos, são lindos!
Ele corou e baixou a cabeça.
- Obrigado! – murmurou.
- Não tem de que.
Ele olhou para mim ainda vermelho e se retirou. Será que ele não estava acostumado com esses elogios? Estranho, pois os olhos dele chamavam atenção de longe.
Matheus apareceu no quarto e me chamou. Saí rapidamente atrás dele e voltamos à pequena loja.
- Você ira trabalhar três vezes por semana. Segunda-feira, quarta-feira e sábado. Está bem? – perguntou ele.
- Claro. É melhor assim. – respondi.
- Ótimo. Vou fiscalizar os outros funcionários e já volto.
E saiu. De costas, Matheus era facilmente confundível, ninguém saberia diferenciar ele de Alex. Aquilo me torturava muito.
A loja tinha pouco movimento, era bom de trabalhar.
Eu estava olhando os carros passarem na rua, quando um menino do meu tamanho, de cabelinhos castanho médio e bem enroladinhos até os ombros, falou:
- Eai, que primeira impressão a loja te causou?
- É...Boa! – gaguejei.
Ele riu.
- Prazer, sou Denis um funcionário daqui.
- Ata, sou Bia! – tentei ser educada.
Ficamos conversando por horas – já que a loja estava vazia – até que meu celular tocou. Olhei e era minha mãe. Achei estranho.
- Mãe? - atendi
- Oi Amor! Estou com saudades, onde você está? – falou ela.
- Estou trabalhando. – eu falei e ela riu – É sério, arrumei um emprego.
- Acredito. – ela disse rindo.
- Qual é o motivo da ligação?
- Chegou uma carta para você. Eu não abri e o remetente está apagado, como se a pessoa não quisesse que você visse o endereço.
- Que estranho! Vou passar aí de tarde, quando o pai não estiver.
- Está bem. – respondeu ela triste – Tchau.
- Tchau.
- Bom trabalho. – ela desejou rindo outra vez.
- Não irei te agradecer só porque está rindo. – falei irreverente.
Ela desligou.
Depois de alguns minutos e loja começou a ter movimento. Comecei a trabalhar. Eu estava achando legal ficar na recepção vendo tudo e todos, até dois rapazes entrar. Eu os conhecia. Era Max e Luiz, os amigos de Alex e Gabi, um vazio me invadiu.
- Bia! – Max gritou – Você sumiu, hein!
- Você que sumiu. – eu disse rindo – Oi Max, oi Luiz.
- Olá Bia! – respondeu Max.
Luiz ficou calado, como se não tivesse me ouvido.
- Oi Luiz? – insisti.
- Esquece, ele está assim desde quando a Gabi se foi. Não fala com ninguém!
- Não sabia que ele era tão apegado a ela assim.
- Nem eu.
Luiz estava péssimo. Com olheiras profundas e roxas, sua boca ressecada como se estivesse sem falar a meses, o rosto pálido e expressão completamente vazia.
- Eu o entendo. – falei para Max, mas olhando para Luiz – Também me sinto vazia às vezes. Perdi meu namorado e minha melhor amiga.
- Mas ele é exagero. Não fala com ninguém, nem com os pais dele. Nem lembro mais como é a sua voz. Ele só anda atrás de mim, não me larga por nada e fica o tempo inteiro calado, eu sinto como se tivesse uma sombra loira. É assustador. – Max sussurrou.
- Nossa! É exagero mesmo. Então, o que querem comprar? – perguntei mudando de assunto.
- Vou dar uma “rodada” na loja e vejo o que quero.
- Ta bom.
Ele saiu e Luiz o seguiu sem olhar para trás ou para os lados, sempre para frente. Era assustador de ver, ele parecia um zumbi ou hipnotizado.
Continuei meu serviço, que eu estava adorando.
A hora passava rápido quando eu me distraia. Max e Luiz ainda estavam lá dentro, escolhendo o que comprar e depois apareceram com uma cesta cheia de coisas acadêmicas para eu passar no caixa.
- Nossa! Vão virar professores de academia ou pretendem ficar mais “bombados”? – comentei olhando para a montanha de coisas.
- Não. Na verdade, nem sei o que vou fazer com isso tudo. Comprei porque me chamaram atenção. – respondeu Max.
Luiz bufou.
- Tem distúrbio a consumir? – perguntei rindo.
- Às vezes penso que sim.
Nós dois rimos.
Passei tudo com paciência. Depois eles pagaram e se “viraram” para levar tudo. Antes de sair, Max se virou para mim e pediu:
- Quando puder, conversa com ele. Não aguento ver ele assim.
- Claro. Amanhã pode ser?
- Sim, eu venho te buscar aqui de tarde.
- Ta bom. Tchau.
- Tchau.
Fiquei trabalhando por mais uma hora até Matheus aparecer e falar que meu horário já havia se esgotado:
- Pode ir embora agora, Bia, amanhã é domingo então não precisa vir. Quer que eu te leve para casa?
- Não precisa. Vou ir para a casa de minha mãe, chegou uma correspondên-cia para mim lá e eu vou pegar. Mas obrigada.
- Por nada.
Saí e fiquei parada do lado de fora da loja esperando um táxi. Não demorou muito e apareceu um. Fui para a casa de minha mãe como havia dito a Matheus.
Durante o caminho pude perceber que, realmente, a casa de Nanda ficava longe da minha antiga.
Cheguei e minha mãe estava aflita segurando a carta. Ela se levantou do sofá num pulo, quando me viu entrar.
- Aqui está minha filha! – disse ela me entregando a carta – Abra logo!
- Calma. – falei rindo.
Olhei e vi que o remetente e o endereço estavam apagados. Abri rasgando o envelope e logo reconheci a bela letra. Aquela letra era inconfundível, jamais esqueceria.
O local de onde havia sido enviada estava em letra ilegível, como se fosse um código. Percebi que minha mãe já havia tentado desvendar as letras, mas pelo jeito não conseguiu.
- Sabe o que significa isso? – ela perguntou.
- Não! – respondi com um ar de reprovação.
Tentei esquecer aquele código e ler o resto da carta.
Minha mãe estava mais ansiosa do que eu.
Rio de Janeiro, 10 de Outubro.
Beatriz Luiza Vasconsellos,
Você não sabe o quanto estou sofrendo pelo o que te fiz. Foi realmente necessário.
Descobri que você culpou o seu pai por conta de minha partida (não te digo quem me contou). Ele não tem tanta culpa assim. Eu que fui um fraco, inútil e insensível. Desculpe-me Bia, sofro por isso até hoje.
Mas não é este o motivo por ter te escrito. Na verdade, eu preciso te dizer uma coisa, uma simples coisa: Seja feliz! Mesmo que me machuque te ver com outro, é o que eu gostaria que você fizesse.
Abra seu coração para um novo amor. Seja Rodrigo ou qualquer outro, mas se livre desta prisão que a coloquei.
Ultima coisa que quero é te ver sofrer, muito menos se a culpa for minha. Fui embora porque precisei e te prometo nunca mais voltar. Já te magoei muito, não vou repetir este erro.
Te amo muito!
Alex Ferreira Bittencourt.
PS: Não estou morando com Gabi, ela está na Inglaterra e eu... Bom, não posso dizer, mas estou longe dela. Não posso te ligar e foi um milagre conseguir te escrever, então, não espere mais nenhum sinal.
Te amo demais e demais!
Alex Ferreira Bittencourt.
Receber aquela carta era a melhor coisa que poderia me acontecer. Mas fiquei triste por não conseguir ler o local de onde ela havia sido enviada. Parecia um código. Parecia que ele quisesse que eu descobrisse, mas sem demonstrar muito isso.
Eu queria descobrir. Eu prometi a mim mesma descobrir.
- Então minha filha, de quem é? O que fala? – perguntou minha mãe interrompendo meus pensamentos
- É dele mãe! É dele! – falei chorando de felicidade – Leia!
Ela leu atenta e depois perguntou:
- Ainda não sabe o que está escrito aqui? – ela apontou para o local e a data.
- Não sei. Parece um código. Mas eu vou descobrir.
Ela continuou a ler e no final comentou:
- Acho que ele tem razão. Se abra para um novo amor.
- Eu tento mãe, mas não consigo.
Ela me abraçou forte, até que me dei conta da hora.
- Tenho que ir, o papai vai chegar logo.
- Bia, pare com isso, converse com ele. – pediu ela.
- Não dá. Será muito difícil perdoar ele pelo o que fez.
- Te entendo. Mas como você vai embora? Onde você esta morando?
- Não se preocupe. Pago um táxi e estou em um ótimo lugar. Agora tenho que ir.
- Tchau. – ela me deu um beijo no rosto.
- Tchau.
Peguei a carta e saí.
Achei rapidamente um táxi, entrei e fui lendo outra vez a carta durante o caminho. Onde será que ele estava? Por que não poderia entrar em contato comigo? O que meu pai fez a ele?
Eram tantas perguntas que eu queria fazer a ele.
Como será que ele estava, de aparência e de sentimentos? Será que continuava perfeito como antes? Ou melhor? Ainda gostava de mim como dizia antes, ou realmente tínhamos terminado por ali?
Sem ele eu voltava a me sentir incompleta. Apenas a menina mimada pelos pais que tem tudo. De que adiantava ter tudo se ele não existia mais?
Minha vontade era de sair correndo atrás dele. Procurar por ele em cada canto do mundo. Mas eu teria que achar uma pista de onde eu deveria começar. E ela estava na minha mão, mas eu não conseguia ler.
- Chegamos moça! – avisou o motorista do táxi.
- Ah, obrigada! – agradeci.
Paguei-o e entre na grande casa de Nanda.
Todos estavam na sala conversando, menos Laura. Como sempre, ela estava na cozinha.
Fui tomar um banho e depois desci até a cozinha para ajudar Laura com o jantar.
- Precisa de ajuda? – perguntei educadamente.
- Para falar a verdade, preciso!
- O que posso fazer?
- Prepara uma sobremesa e só. Pode ser um simples pudim, só para adoçar a boca.
- Ta bom.
Sorte que minha mãe me ensinou a fazer doce. Eram as únicas coisas que eu sabia fazer.
Terminamos de preparar o jantar e todos vieram correndo comer. Eles pareciam um leão devorando um prato de comida depois de meses sem comer.
Era boa a sensação de ver todos apreciando o que você fez. Era assim que a empregada lá de casa se sentia? Se for, eu lhe dou razão.
Estava muito agradável jantar com eles, mas a imagem da carta ainda não saía da minha cabeça. Milhões de fatos passavam por minha mente, varias perguntas me perturbavam.
Quais motivos o levou para ir embora? Do que meu pai o ameaçou?
Mas pelo menos aquela carta me mostrou uma coisa; Ele ainda me amava! E só queria que eu fosse feliz. Mas eu também queria a felicidade dele, e pela carta ele não demonstrava isso. Só que ele não pensou uma coisa: é impossível ser feliz sem ele. Quando ele foi embora, levou minha paz junto.
Eu queria seus braços confortantes, seu beijo que me deixava tonta, sua voz que me enlouquecia, seu jeito educado. Eu o queria.
Faria qualquer loucura para vê-lo outra vez. E neste momento me lembrei de Luiz. Ele estava pior do que eu. Precisava ir até ele.
Nanda interrompeu meus pensamentos:
- Ei Bia, o que foi? Aconteceu alguma coisa?
- Nada não! Estou pensando.
- Ata.
Terminamos o jantar tranquilamente. Ajudei Laura com a cozinha e depois fui dormir.
Já era de madrugada, eu estava em um sono leve, quando meu celular tocou. Nem olhei o número e atendi, na esperança de já saber quem era:
- Alô?
- Bia? Onde você esta menina louca? – perguntou a voz exagerada de Rodrigo.
- Estou bem Rodrigo, me deixa. – falei sussurrando.
- Mas... – eu desliguei antes dele terminar.
Olhei para a porta e me assustei. Marcos estava parado lá.
- Desculpe, é que eu estava passando e ouvi vozes, então vim checar. – disse ele.
- Claro. Você está certíssimo. Vou aproveitar que estou acordada e vou comer alguma coisa.
- Também estava indo. Vamos?
Levantei-me e desci as escadas conversando com ele.
Luana estava lá assistindo televisão, como se não tivesse sono. Ela nem ligou de passarmos na sua frente. Marcos me olhou pelo canto do olho e logo me explicou:
- Ela é sonâmbula. – ele riu.
Soltei um leve sorriso.
Ficamos por horas conversando na cozinha. Comíamos doces e brincávamos sobre tudo.
Mas logo o sono me pegou. Subimos para o quarto de novo juntos, ele me deixou na porta do meu quarto e depois seguiu em direção ao dele – que ficava no início do corredor.
Dormi rapidamente, estava tão exausta. Foi uma noite completamente sem sonho. Nenhuma nova visão.
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