quarta-feira, 6 de julho de 2011

Capítulo 17


17- O BEIJO


            Amanda apareceu no corredor e me pediu para que entrasse no quarto. Ela e Renan saíram nos deixando sozinhos.
            Alex fitava meu rosto com uma certa angústia no olhar. Seus olhos imploravam meu perdão. Eu queria perdoá-lo, mas não conseguia perdoar a mim mesma. Estava imaginando que deveria ter contado aos seus pais quando descobri.
            Sentei-me ao seu lado. Ele apenas esticou o braço para pegar em minha mão. Seu toque estava frio.
            - O que seus pais decidiram? – perguntei com indiferença.
            - Ainda não sabem o que fazer.
            Levantei sua mão para que tocasse em meu rosto. Mesmo estando fria o toque ainda me fazia bem.
            Renan e Amanda retornaram a sala. Amanda parecia mais calma, carregando um copo com água na mão.
            - O doutor disse que essa dependência tem cura. – ela falou.
            - Como? – Alex perguntou levantando-se animado.
            - Clínica de reabilitação. – Renan respondeu – É uma droga que se cura com mais rapidez, mas ainda sim é um tratamento muito caro.
            - Não quero entrar em uma clínica de reabilitação. – Alex resmungou.
            Óbvio que ele não queria, ninguém quer. Imaginar que teria que se tratar de algo que ele poderia muito bem ter evitado era constrangedor. Mas pensar em continuar nesta vida era muito pior.
            - Nem se quisesse iria entrar. – Renan falou.
            Todos o olharam abismados, excluindo Amanda, ela o olhava como quem concordava.
            - Não temos dinheiro para um tratamento. – ele completou.
            O problema era dinheiro?
            - Eu pago! – falei.
            Agora as atenções estavam todas em mim.
            - Tenho dinheiro, posso pagar.
            - Isso não seria certo. – Amanda protestou.
            - Por que não? Sou da família mais rica daqui; meus pais têm dinheiro para dar e vender, principalmente depois que minha mãe começou a namorar um Valentyne; trabalho em uma famosa academia e uso todo o salário para equipar meu carro. Acho que está na hora de fazer algo útil com todo esse dinheiro.
            - Mas Bia...
            - Amanda, - interrompi – até hoje só gastei dinheiro com luxos para equipar e manter meu BMW, esse gasto não fará nenhuma diferença. Deixe-me ajudá-lo?
            - Acho que esta não é a hora para orgulho, Amanda. – Renan falou – Precisamos muito desse dinheiro e Bia pode, e muito, nos oferecer.
            - Não quero que você pague. – Alex interferiu.
            - Não estamos pedindo sua opinião, Alex. – respondi.
            Ele ficou quieto e cobriu o rosto com o travesseiro.
            - Aceitamos, Bia. – Renan deu o veredicto.

            Alex voltou para casa depois de um dia em observação no hospital.
            Fui junto com Renan e Amanda ver se havia vaga na clínica de reabilitação mais próxima. Por sorte, a clínica estava com poucos internos e várias vagas.
            Difícil mesmo foi ajudar Alex a arrumar as malas. Parecia a pior sensação que existia. Sentia como se estivesse ajudando-o a partir dali, a partir da minha vida.
            - Parece que nunca mais irei te ver novamente. – falei.
            Ele estava dobrando uma camisa e colocando em cima de sua cama quando eu lhe disse isso. Seus movimentos foram interrompidos e seus olhos passaram a me fitar.
            - Também sinto isso. – ele suspirou.
            Foi impossível reprimir o impulso de andar em sua direção e lhe dar um abraço. Afundei meu rosto em seu peito, tentando absorver a fragrância de seu perfume. Um cheiro adocicado e perfeito. Alex apertou seus braços em minhas costas e encostou a boca em minha orelha.
            - Caso nunca mais no vejamos, quero que saiba: Te amo!
            - Claro que vamos nos ver. – falei, vendo minha voz se perder aos poucos.
            Voltamos a arrumar as coisas. Alex foi organizar suas roupas enquanto eu separava seus calçados.
            Amanda entrou para nos ajudar. Levamos todas as malas para dentro do carro de Renan.
            Alex ainda parecia relutante com a ideia de ir para uma clínica de reabilitação.
            Seus pais já estavam dentro do carro, prontos para sair, quando ele me abraçou.
            - Promete se cuidar? – ele perguntou.
            - Você promete se cuidar? – rebati a pergunta.
            - Claro.
            - Então também prometo.
            Nossos lábios se tocaram devagar. Encostei a mão em seu peito e pude ouvir um coração frenético batendo lá no fundo. Nos separamos e ele caminhou até o carro.
            Fiquei parada vendo-os partir, levando a minha paz junto.
            Caminhei devagar até chegar a minha casa. Ignorei Carla na sala de estar e fui direto para meu quarto. Atirei-me na cama disposta a despejar tudo o que eu sentia.
           
            Acordei com um sopro em minha orelha. Abri os olhos para um rosto caramelo, sorrindo a dentes brancos e cabelos arrepiados.
            Estiquei meus músculos rígidos e doloridos.
            - O que faz aqui, Rodrigo? – perguntei.
            - Fiquei sabendo que Alex ficará um tempo fora, sei que isso não te fará bem, então estou aqui para animá-la.
            Foi dito e feito!
            Levantei e me arrumei, coloquei uma das minhas velhas camisetas largas, boné para trás e All Star. Descemos para o jardim e me deparei com um Ferrari FF vermelho. Olhei interrogativamente para Rodrigo. Pelo que me lembrava, Paulo o fizera devolver os carros que tinha e lhe dissera que não daria novos.
            - Paulo me emprestou. – ele respondeu sorrindo.
            Entramos em seu belo carro. Ele ligou e saiu disparado, em direção oposta a que eu pensava, para mais dentro de Alphaville.
            - Aonde vamos? – perguntei.
            - Quero ir a um lugar e quero que você venha comigo.
            Não perguntei nada, apenas assenti.
            Ele dirigiu muito rápido pelas estradas desertas até chegar em frente a um imenso portão de ferro. Passamos pelo portão e começamos a andar na pequena estrada que daria até a imensa mansão à frente. Descemos do carro. Rodrigo pegou uma chave do bolso e abriu a imensa mansão.
            Pela primeira vez vi a mansão Valentyne escura e desabitada.
            Rodrigo acendeu as luzes da grande sala de estar branca. Os móveis estavam cobertos com plásticos e o cheiro de pó estava no ar.
            - Sinto falta daqui. – Rodrigo suspirou.
            Fechei a porta atrás de mim. Rodrigo soltou outro suspiro e começou a correr escada acima. Segui-o mais vagarosamente. Ele estava em seu quarto.
            Antigamente o quarto era extremamente amplo. Possuía sofá, televisão e jogos eletrônicos logo na entrada; a cama ficava ao fundo, perto do closet; tudo rodeado por uma imensa bagunça de roupas e antigos brinquedos.
            Hoje só possuía a porta do closet e a janela trancada. Parecia bem mais amplo sem a bagunça, fazia até eco.
            Primeiro ele admirou o quarto, depois voltou e começou a andar pelo corredor. Parou ao lado de uma porta próxima a do seu quarto.
            - Lembra daqui? – ele perguntou.
            Andei até a porta e a abri. Era um quarto com paredes rosa-chiclete, cama alta, cortinas escuras e um amplo espaço.
            - Era o quarto que você mandou fazer para mim. – respondi.
            Rodrigo implorara para Roberto fazer para quando eu precisasse dormir lá e Suélen decorou-o com tudo que ainda havia nele.
            Entrei no quarto e me sentei na imensa cama. Rodrigo fechou a porta e se sentou ao meu lado.
            - Lembra das situações que passamos aqui? – ele perguntou.
            - Lembro de quando queimamos a televisão que havia aqui e fingimos não saber nada só para não levarmos broncas.
            - Minha mãe acha até hoje que foi a empregada quem queimou.
            Nós dois caímos em risos.
            Rodrigo levantou e foi até o closet, pegou uma colcha rosa e a jogou em cima da cama. A colcha possuía uma mancha marrom no centro.
            - E essa mancha, recorda?
            - Claro. Foi em um dia de chuva forte que não pude ir embora. Você pediu chocolate quente para nós e acabei derramando quando deu um trovão extrema-mente alto.
            - Ri tanto que aumentei a mancha com o meu chocolate quente.
            - Naquele dia cheguei em casa às duas da manhã.
            - Não aceitou dormir aqui. Nem naquele dia e nem nunca.
            - Tinha vergonha.
            - Já dormiu na casa do Alex?
            - Não.
            Ele sorriu satisfeito e se levantou. Guardou a colcha manchada de volta no closet.
            Também levantei. Andei até a janela fechada e a abri. O sol que entrava por aquele lado da casa era agradável. Rodrigo andou e parou atrás de mim.
            - Não podemos ignorar o fato de que éramos felizes. – ele falou olhando através da janela a minha frente.
            - Não estou ignorando.
            Saí da janela e voltei a sentar na cama. Ele me seguiu e ficou de frente para mim.
            - Se lembra de quando você resolveu aprender andar de bicicleta e fui te ensinar? Você caiu e ficou com o joelho todo ensanguentado.
            - Tenho a cicatriz até hoje. – choraminguei.
            - Nos damos bem desde bebê, por que você mudou tudo? – seu sorriso desapareceu do rosto.
            - Ainda nos damos bem. – falei.
            Ele jogou o corpo para cima de mim. Deitei de costas na cama, vendo-o me deixar sem saída.
            - Mas era para ser diferente.
            - Não estamos seguindo nenhuma regra, Rodrigo.
            - Você levou minha paz quando terminou comigo no jardim daquela escola.  – ele aproximou seu rosto do meu.
            - Me deixe levantar, Rodrigo. – ignorei sua frase.
            - Só peço uma chance. – ele sussurrou.
            Ele deixou a boca apenas a um centímetro da minha. Tentei empurrar seu peito, mas foi inútil.
            - Não te quero como irmã, nunca. Onde já se viu amar uma irmã dessa forma?
            - Rodrigo, sai de cima de mim.
            - Eu te amo.
            Foi o que bastou para ele tocar os lábios nos meus. Fechei a boca ao máximo, não deixando-o me beijar. Continuei tentando afastá-lo de mim.
            Quando senti que sua mão deslizava por dentro da minha camiseta apertei meus dentes em seus lábios e empurrei seu corpo com minha perna. Ouvi-o cair com um baque surdo.
            Atravessei o quarto em um segundo. Desci as escadas à pressa ouvindo ele pedir desculpas várias vezes atrás de mim.
            Ignorei o Ferrari estacionado no jardim, decidida a atravessar toda a imensa propriedade Valentyne a pé.
            Rodrigo me seguiu com o carro e me insistiu várias vezes para entrar, mas ignorei e andei durante vários minutos até minha casa. Ele desistiu e foi embora.
            Passei o resto do dia pensando no que acontecera na casa de Rodrigo.
            Talvez eu já esperava aquilo. Era só questão de tempo até ele desistir da ideia de me aceitar como irmã. E não era por amor que ele fazia isso, era apenas questão de princípio. Isso era algo que ele herdara de Suélen.
            Talvez tivesse sido alguma burrice minha acreditar que poderia passar um dia civilizado com Rodrigo.
            Comecei a pensar se com Marcos seria a mesma coisa. Concluí que não. Ele estava feliz com Fernanda... Ou pelo menos aparentava.
            Já passavam das dez da noite. Eu estava deitada em minha cama pensando em tudo isso, enquanto a razão da minha existência estava longe de mim.
            Senti como se tivesse ficado deitada sem consciência durante todo o tempo em que Alex se foi.
            Durante todo esse tempo ia um dia sim e um dia não visitar Alex na clínica. A cada visita, ele parecia estar melhor. Engordara até assumir seu corpo habitual, pegara mais cor no rosto e sorria mais ao me ver. Sempre a garota que cuidava dele me falava para ter cuidado com a proximidade, pois sem a droga ele se excitava com muita facilidade.
            Visitei várias vezes Marcos, Nanda, Laura, Luana, Matheus, Amanda e Leandro na república. Nanda e Marcos pareciam felizes juntos, mas ainda era possível ver a dor que era para ele me ver falar de Alex.
            Todas as minhas tardes que passaria sozinha Rodrigo aparecia e me fazia esquecer um pouco a realidade – eu já o havia desculpado pelo que fez, afinal precisava de alguém. Um dia íamos ao cinema, no outro ao parque aquático, outro na sorveteria ou simplesmente deitávamos no gramado de casa e ficávamos olhando os desenhos que as nuvens faziam.
            Teve dias em que Max e Luiz foram a minha casa e nós saímos para distrair. Até Olavo ajudou, embora ainda estivesse com um pouco de trauma com skates, andamos por Alphaville.
            O melhor mesmo foi meu último dia em recuperação. Terminei a escola e saí com o certificado na mão.
            Era a última semana de fevereiro. Aquele era o último dia de recuperação e o primeiro de aula normal. Fiquei aliviada por não estar incluída na nova turma do terceiro colegial.
            Estava ansiosa para chegar à noite. Alex recebera três dias em casa por bom comportamento e recuperação. Claro que pediram para vigiarmos ele o tempo todo, sem saídas sozinho!
            Acelerei direto para a Marshel’s academia. Estava disposta a apertar o botão de avançar para poder ver meu amado. Não o via fora daquelas paredes brancas fazia duas semanas.
            Cansei bastante no trabalho. Diogo também terminou o expediente já ofegante.
            Disparei como uma louca, direto para a casa dos Bittencourt, assim que saí. Estava cansada, mas esqueci assim que pensei em poder abraçá-lo.
            Parei no jardim da casa e toquei a campainha freneticamente. Amanda atendeu e sorriu ao ver minha ansiedade.
            Alex estava de pé no centro da sala. Um leve sorriso torto abria em seus lábios, seus olhos pareciam cheios de um brilho.
            Não pensei duas vezes para atravessar a sala e lhe dar o abraço que tanto ansiava. Afundei meu rosto em seu peito. Ele levantou meu rosto e tocou meus lábios de leve.
            - Senti sua falta. – falei.
            - Também senti a sua. – ele respondeu, inspirando o cheiro de meus cabelos.
            Subimos até o seu quarto. Contei tudo o que acontecera comigo durante sua estada fora, menos a parte de Rodrigo, depois ele falou como era o tratamento na clínica.
            Voltei tarde para casa. Tomei apenas um banho e fui diretamente dormir, feliz por saber que no outro dia teria Alex inteiro para mim.

            Estávamos sentados no gramado de casa. Ele acariciava meu rosto com uma mão enquanto a outra apertava minha cintura. Eu brincava com um botão solto de sua camisa.
            Não falávamos nada, afinal não havia nada a ser dito. Apenas me encostei em seu ombro e fiquei acompanhando-o subir a descer enquanto Alex espirava.
            Continuávamos imóveis quando um Hilux preto estacionou ao nosso lado. Rodrigo desceu animado do carro, mas parou quando viu Alex.
            - O que está fazendo aqui? – ele trovejou.
            - Passando uma manhã agradável com a minha namorada... Até agora.
            Eles começaram a se fuzilar com os olhos. Levantei abruptamente e me coloquei entre os dois quando vi que Rodrigo avançava.
            - Pensei que haviam se entendido. – falei com a voz severa.
            - Tolerar não significa entender, Bia. – Rodrigo respondeu – Estava suportando-o até o momento em que ele virou um viciado e te deixou toda magoada assim.
            - Como se atreve a falar como se eu tivesse alguma culpa por ser drogado?
            - Não tem? Ou está insinuando que tenho algo haver com isso?
            Fiquei espremida entre os dois. Cada orelha minha estava em um tórax diferente.
            O olhar de Rodrigo faiscou para Alex. Alex abriu a boca para falar algo, mas fechou segundos depois e virou o rosto para o outro lado.
            Rodrigo ia me falar algo, porém foi interrompido por uma freada do outro lado da rua. Era um Mercedes SL 350 Sport conversível, vermelho. Uma garota loura desceu do carro e começou a andar em nossa direção.
            Senti minhas pernas congelarem e meu estômago revirar. Não via Suzana há muito tempo, por um momento tinha até me esquecido que a psicopata agora estava loura, alta e bonita.
            - Fiquei sabendo que você estava de volta, Alex, - ela falou – pensei em te visitar.
            Alex olhou automaticamente para mim. Suzana também fez o mesmo.
            - Ah! Bia, olá! Quanto tempo. – ela me cumprimentou – E você deve ser o Valentyne, não é?
            Rodrigo assentiu.
            - Acho que me lembro de quando você tentou me flertar na formatura e tudo acabou comigo molhada por uma ex-namorada ciumenta.
            Trinquei meus dentes para ela.
            - Então, Alex, como está? – Suzana virou-se para ele e lhe deu um abraço. O abraço que quase me fez voar em seu pescoço, mas estranhamente Rodrigo segurava firme meu braço.
            Ela se afastou de Alex e ficou somente segurando sua mão.
            - Fiquei realmente preocupada quando me falaram do que aconteceu com você.
            Alex apenas sorriu.
            - O que faz aqui? – sibilei.
            Ele jogou o cabelo para trás e virou o rosto para mim. Um estranho sorriso saía de seus lábios.
            - Vim somente ver Alex. Sem ressentimentos, Bia.
            Virei meu rosto para tentar acreditar que ela não estava ali. Se minha consciência começasse a crer no que via, sem dúvidas voaria em seu pescoço.
            - Volto em uma hora quando sua namorada estiver mais calma. – Suzana falou para Alex – Acho que cheguei no meio de uma briga.
            Ela acenou e andou em direção ao carro, depois só foi possível ouvir o Mercedes saindo.
            - Acho melhor eu ir também, o clima não ficou muito bom. – Rodrigo falou.
            Soltei sua mão para ele poder ir ao carro. Segundos depois era só eu e Alex outra vez.
            - Isso foi realmente estranho. – Alex falou.
            Entramos em casa para comer alguma coisa. Ele ainda continuava muito faminto, mas o médico dissera que isso era bom, satisfazia um pouco a vontade.
            À tarde Alex decidiu que precisava ir ao Valentyne’s Bank para falar com Roberto. Insisti para dirigir, só que ele dissera que poderia guiar o carro normal-mente, então fomos de Audi até Barueri.
            Era fim de tarde quando chegamos a casa dele. Disse que precisava ir à república, então o deixei com Amanda e fui até minha casa pegar meu carro.
            Dirigi devagar até chegar à casa de Nanda. Toquei a campainha duas vezes até Leandro atender.
            - Que bom te ver, Bia.
            - É bom te ver também, Leandro. – falei enquanto entrava.
            Reparei que não havia ninguém em canto algum.
            - Onde estão os outros? – perguntei.
            - Matheus está na loja dele, as meninas foram fazer compras no shopping e Marcos está lá em cima.
            Assenti e comecei a subir as escadas. Bati uma vez na porta de Marcos e ele me mandou ir embora, mesmo sem saber quem era.
            - É a Bia. – falei.
            E a porta se abriu em dois segundos.
            - O que está fazendo aqui? – ele perguntou.
            - Vim só fazer uma visita, mas se não está muito afim posso ir embora.
            - Claro que não! Fica. – ele escancarou a porta.
            Entrei e me deparei com a habitual bagunça de um quarto masculino. Depois que Alex passou a também fazer isso, a bagunça masculina já não me assustava.
            - Por que estava trancado aqui? – perguntei.
            Ele hesitou e tentou mudar de assunto:
            - Fiquei sabendo que Alex recebeu uma folguinha, não deveria estar com ele?
            - Precisava pegar meu pagamento um pouco adiantado esse mês, mas o Matheus não está, só achei que era bom te ver.
            - Foi excelente você ter vindo. Vai esperar o Matheus chegar?
            - Melhor não, tenho tão pouco tempo com Alex que quero aproveitá-lo ao máximo.
            - Entendo. – ele suspirou – Se Matheus chegar cedo eu peço para ele levar o dinheiro para você.
            - Obrigada Marcos. – abracei-o.
            Na volta para a casa de Alex parei em casa e troquei de roupa. Coloquei uma camiseta azul larga, um mini-short jeans – que ficava coberto pela camiseta gigante -, um tênis Nike sem amortecedores. Era o visual que Alex tanto amava em mim. Voltei correndo para o carro e disparei rumo aos Bittencourt.
            Levei um susto quando vi que havia um carro parado no jardim da casa de Alex. Era o Mercedes de Suzana. Desci exasperada do carro e entrei sem bater. Apenas Amanda se encontrava a vista.
            - Cadê o Alex? – perguntei.
            - Lá em cima. – ela respondeu.
            - Com a Suzana? – minha voz subiu duas oitavas.
            - Calma Bia. É, a Suzana está lá em cima também, mas e daí? Você não confia no Alex?
            - Falar é muito fácil. – resmunguei enquanto subia as escadas.
            Todos achavam que era tudo mero ciúmes, contudo não era. Estava preocupada em imaginar aquela psicopata trancada com Alex. Quem sabe o que ela poderia estar fazendo?
            Abri a porta sem ao menos bater e naquele instante me perguntei se havia entrado no quarto errado.
            Suzana estava encostada na parede, Alex a sua frente. A mão dele tocava sua cintura, enquanto as dela seguravam em seu pescoço. Mas o pior foi mesmo ver que seus lábios estavam se tocando.
            Nenhum deles percebeu minha aproximação então a cena continuou. Vi que ele deslizava a mão para dentro da blusa dela. Foi aí que decidi acabar com tudo.
            - Alex?
            Seu corpo se afastou instantaneamente quando ouviu minha voz. Primeiro ele olhou para meu rosto chocado, depois fitou desorientado Suzana a sua frente.
            - O que eu fiz? – ele perguntou a si mesmo, colocando a mão na cabeça.
            Percebi que Suzana sorria atrás de Alex. Teria descontado toda a minha raiva ali se não tivesse tão machucada.
            Tentei colocar em minha cabeça que tudo era culpa da psicopata, mas nada conseguia mudar o fato de eu ter visto meu namorado beijando outra.
            Um nó intenso se apertou em meu estômago. Era pior do que ficar separada dele por algumas semanas, ou até mesmo por meses. Era a dor de imaginar ficar sem ele para sempre.
            Dei-lhes as costas e saí com a garganta apertada. Alex começou a me seguir desesperado. Desci as escadas e corri direto para a porta, ignorando Amanda na sala. Entrei apressada no carro, tentando não ouvi-lo falar.
            Acelerei como uma louca pelas estradas de Alphaville. Parei em frente a minha casa. Pensei em ir para outro lugar, mas nenhum parecia adequado, então sentei no degrau da varanda e apoiei minha cabeça na perna.
            Já estava cansada de chorar. Não tinha um dia realmente bom, sem problemas, há meses.
            Ouvi a porta atrás de mim se abrir. A sombra de Carla se projetou no gramado a minha frente.
            - O que foi, Bia? Não vai entrar?
            - Vai embora! – gritei.
            - Olha como fala comigo, sou sua mãe...
            - Não é não! – gritei outra vez.
            Ela ficou parada por alguns instantes e depois fechou a porta. Sem dúvidas teria de pedir desculpas depois para ela. Nunca havia jogado em sua cara que não era minha mãe.
            Claro que ela era.
            Mas eu não estava para mais problemas naquela hora. Apenas abaixei a cabeça e deixei as lágrimas jorrarem.
            Sabia que era só questão de minutos para Alex aparecer ali.
            Ouvi passos no gramado, eles cessaram quando chegaram próximos de mim. Já estava preparada para mandar ele ir embora, pensando que era Alex, quando ouvi uma voz que não era grave falar:
            - O que faz aí?
            Era a voz melodiosa que ouvira à tarde, a de Marcos.
            Levantei meus olhos encharcados para encontrar seu rosto. Ele me olhava com preocupação. No começo sua voz parecia irônica ao perguntar, mas na hora que viu meus olhos inchados ele realmente ficou inquieto.
            - Nada. – respondi.
            Ele sentou-se ao meu lado, colocou o envelope, que carregava, no bolso e olhou para mim com reprovação.
            - Não confia em mim para contar seus problemas? Pode falar! É bem melhor do que guardar para si mesma.
            - Por que tudo tem que dar errado para mim? – falei enquanto soluçava em choro.
            - Por que diz isso?
            - Primeiro tem uma psicopata atrás de mim, que voltou para Alphaville, mas ninguém acredita. Depois meu namorado que se envolve em drogas. Rodrigo que diz não ter aceitado o fim do nosso namoro...
            - Você parecia estar lidando bem com isso. – Marcos me interrompeu.
            Levantei subitamente.
            - Estava, até ver Alex beijando outra.
            - O quê? – ele também levantou.
            - Tem ideia de como isso dói para mim, Marcos? Sempre confiei em Alex, mesmo sentindo ciúmes, sempre acreditei que ele jamais me trairia, para chegar hoje e ver que foi tudo uma mentira.
            Encostei meu rosto no peito de Marcos, que me abraçou e encostou o queixo no alto de minha cabeça.
            - Não foi a menina que deu em cima dele?
            - Mesmo que fosse, ninguém estaria tão absorto como ele estava. Alex não é mais quem sempre foi.
            - Realmente ele me surpreendeu. É, não existem pessoas perfeitas, é tudo questão de máscara.
            - Odeio completamente ele! – gritei, tirando a aliança de minha mão e atirando no gramado.
            Comecei a encharcar a camiseta de Marcos com as minhas lágrimas. Afastei meu rosto e fiquei apenas com a mão tocando seu braço.
            - Odeio te ver assim. – ele falou.
            Não respondi.
            - Trouxe seu pagamento. – Marcos falou, abanando o envelope – Matheus falou que você ainda não trabalhou o suficiente para recebê-lo.
            Dei uma leve risada. Foi uma risada não muito animada, mas o suficiente para fazer Marcos rir também. Ele tocou em meu queixo e levantou meu rosto para encarar seus olhos.
            - Não sabe o quão bom é ver que fez a pessoa que mais ama sorrir em uma hora em que ela só quer chorar.
            - Nanda ia me matar se te ouvisse falar isso. – sussurrei.
            - O que ela poderia fazer? É a mais pura verdade.
            - O que quer dizer?
            - Quero dizer que ainda te amo muito e tenho vontade de matar o Alex toda vez que te vejo chorar.
            - Não gosta da Nanda?
            A ideia realmente me provocou raiva. Por que ele estava namorando a minha melhor amiga se não a amava?
            - Gosto muito da Nanda, mas amor, aquele que sentimos só uma vez na vida, é só por você.
            Desviei o olhar. Talvez eu estivesse carente e despedaçada, pois as palavras de Marcos me fizeram sorrir.
            - É impressão minha ou você acabou de sorrir outra vez? – ele voltou a levantar meu rosto.
            - Não devia estar dizendo isso a mim.
            - Mas eu te amo.
            Senti que sua mão desceu do queixo para o meu pescoço e escorregou para trás da minha nuca. Seus lábios ficaram a apenas alguns centímetros dos meus.
            Minha cabeça gritava para escapar de seus braços, mas uma dor lá no fundo da alma me dizia que poderia ser reconfortante.
            Comecei a encarar seus olhos incrivelmente azuis, decidindo rapidamente qual das vozes ouvir. A cabeça silenciou quando seus lábios chegaram aos meus. Pude apenas fechar os olhos.
            Empurrei-o quando a cabeça começou a me acusar. Fiquei apenas com as mãos tocando seu peito.
            - Eu não devia ter feito isso. – falei.
            - Por que não? – sua voz estava adocicada.
            Virei o rosto para desviar de seu olhar, e foi aí que avistei Alex parado na gramado nos fitando. Afastei-me de Marcos abruptamente, agora estávamos a um metro de distância.
            Sua expressão estava derrotada. Marcos o fitava com os dentes trincados. Não consegui pensar em nada.
            - Ele não devia ter visto isso. - falei
            - Ele fez o mesmo com você. – Marcos respondeu.
            - Mas...
            E antes que eu protestasse, ele me puxou e me deu outro beijo. Dessa vez minha consciência gritou ainda mais.
            Alex estava vendo!
            Empurrei Marcos com força e corri para dentro de casa.
            - E o dinheiro? – Marcos gritou quando bati a porta.
            Corri para meu quarto, ignorando Carla na sala. Tranquei a porta e corri para a janela. Pude ver apenas as costas de Marcos. Alex permanecia imóvel.
            Minutos depois ele sentou-se no meio da grama. Ficou parado por um longo momento, até que sua visão tomou um foco. Ele se rastejou pelo gramado e pegou algo entre os dedos. O farol de um carro que passava na rua iluminou o objeto na mão de Alex, apenas pequenas luzes vermelhas puderam ser vistas.
            Era a aliança de rubis.
            Ele levantou a cabeça e olhou para minha janela. Encontrei seus olhos, e neles vi uma dor que pude reconhecer em mim mesma.



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